sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Eduardo Prado Coelho, antes de falecer (25/08/2007)

"Precisa-se de matéria prima para construir um País", Eduardo Prado Coelho - in Público.

"A crença geral anterior era de que Santana Lopes não servia, bem como Cavaco, Durão e Guterres. Agora dizemos que Sócrates não serve. E o que vier depois de Sócrates também não servirá para nada. Por isso começo a suspeitar que o problema não está no trapalhão que foi Santana Lopes ou na farsa que é o Sócrates. O problema está em nós. Nós como povo. Nós como matéria prima de um país. Porque pertenço a um país onde a ESPERTEZA é a moeda sempre valorizada, tanto ou mais do que o euro. Um país onde ficar rico da noite para o dia é uma virtude mais apreciada do que formar uma família baseada em valores e respeito aos demais. Pertenço a um país onde, lamentavelmente, os jornais jamais poderão ser vendidos como em outros países, isto é, pondo umas caixas nos passeios onde se paga por um só jornal E SE TIRA UM SÓ JORNAL DEIXANDO-SE OS DEMAIS ONDE ESTÃO.Pertenço ao país onde as EMPRESAS PRIVADAS são fornecedoras particulares dos seus empregados pouco honestos, que levam para casa, como se fosse correcto, folhas de papel, lápis, canetas, clips e tudo o que possa ser útil para os trabalhos de escola dos filhos...e para eles mesmos.Pertenço a um país onde as pessoas se sentem espertas porque conseguiram comprar um descodificador falso da TV Cabo, onde se frauda a declaração de IRS para não pagar ou pagar menos impostos. Pertenço a um país:
-Onde a falta de pontualidade é um hábito;-Onde os directores das empresas não valorizam o capital humano.-Onde há pouco interesse pela ecologia, onde as pessoas atiram lixo nas ruas e, depois, reclamam do governo por não limpar os esgotos.-Onde pessoas se queixam que a luz e a água são serviços caros.-Onde não existe a cultura pela leitura (onde os nossos jovens dizem que é 'muito chato ter que ler') e não há consciência nem memória política, histórica nem económica.-Onde os nossos políticos trabalham dois dias por semana para aprovar projectos e leis que só servem para caçar os pobres, arreliar a classe média e beneficiar alguns.
- Pertenço a um país onde as cartas de condução e as declarações médicas podem ser 'compradas', sem se fazer qualquer exame.-Um país onde uma pessoa de idade avançada, ou uma mulher com uma criança nos braços, ou um inválido, fica em pé no autocarro, enquanto a pessoa que está sentada finge que dorme para não lhe dar o lugar.-Um país no qual a prioridade de passagem é para o carro e não para o peão.-Um país onde fazemos muitas coisas erradas, mas estamos sempre a criticar os nossos governantes.
Quanto mais analiso os defeitos de Santana Lopes e de Sócrates, melhor me sinto como pessoa, apesar de que ainda ontem corrompi um guarda de trânsito para não ser multado. Quanto mais digo o quanto o Cavaco é culpado, melhor sou eu como português, apesar de que ainda hoje pela manhã explorei um cliente que confiava em mim, o que me ajudou a pagar algumas dívidas.
Não. Não. Não. Já basta. Como 'matéria prima' de um país, temos muitas coisas boas, mas falta muito para sermos os homens e as mulheres que o nosso país precisa. Esses defeitos, essa 'CHICO-ESPERTERTICE PORTUGUESA' congénita, essa desonestidade em pequena escala, que depois cresce e evolui até se converter em casos escandalosos na política, essa falta de qualidade humana,mais do que Santana, Guterres, Cavaco ou Sócrates, é que é real e honestamente má, porque todos eles são portugueses como nós, ELEITOS POR NÓS. Nascidos aqui, não noutra parte... Fico triste. Porque, ainda que Sócrates se fosse embora hoje, o próximo que o suceder terá que continuar a trabalhar com a mesma matéria prima defeituosa que, como povo, somos nós mesmos.E não poderá fazer nada...
Não tenho nenhuma garantia de que alguém possa fazer melhor, mas enquanto alguém não sinalizar um caminho destinado a erradicar primeiro os vícios que temos como povo, ninguém servirá. Nem serviu Santana, nem serviu Guterres, não serviu Cavaco, nem serve Sócrates e nem servirá o que vier. Qual é a alternativa ?
Precisamos de mais um ditador, para que nos faça cumprir a lei com a força e por meio do terror ? Aqui faz falta outra coisa. E enquanto essa 'outra coisa' não comece a surgir de baixo para cima, ou de cima para baixo, ou do centro para os lados, ou como queiram, seguiremos igualmente condenados,igualmente estancados... igualmente abusados!É muito bom ser português. Mas quando essa portugalidade autóctone começa a ser um empecilho às nossas possibilidades de desenvolvimento como Nação, então tudo muda... Não esperemos acender uma vela a todos os santos, a ver se nos mandam um messias.Nós temos que mudar. Um novo governante com os mesmos portugueses nada poderá fazer. Está muito claro... Somos nós que temos que mudar.Sim, creio que isto encaixa muito bem em tudo o que anda a acontecer-nos: Desculpamos a mediocridade de programas de televisão nefastos e, francamente, somos tolerantes com o fracasso.
É a indústria da desculpa e da estupidez. Agora, depois desta mensagem, francamente, decidi procurar o responsável,não para o castigar, mas para lhe exigir (sim, exigir) que melhore o seu comportamento e que não se faça de mouco, de desentendido.
Sim, decidi procurar o responsável e ESTOU SEGURO DE QUE O ENCONTRAREI QUANDO ME OLHAR NO ESPELHO. AÍ ESTÁ. NÃO PRECISO PROCURÁ-LO NOUTRO LADO. E você, o que pensa ?... MEDITE!"

Eduardo Prado Coelho

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

O escândalo de uma bandeira da Câmara Municipal de Lisboa

A Câmara de Lisboa (como gostam de dizer os jornalistas), ou antes, o Município de Lisboa tem uma bandeira. Preta e branca, que os corvos não se vêm ao longe.

Uma bandeira que quase ninguém conhece.

Houve uns cromos que a retiraram e colocaram uma bandeira azul e branca de que ainda muitos se lembram.

O mais incrível da história é que alguém reparou que a bandeira do Município de Lisboa tinha sido retirada. Uma atenção absolutamente notável, há que dizer.

Um drama para a ética republicana que fica logo assustadiça, nervosa, em "stress", o que é estranho para um regime que se julga democrático, apesar de nunca haver sido sufragado pelo voto (e esse sufrágio ser mesmo proibido).

Um susto que nem sequer pode desabafar um "Aqui d'El Rei", porque enfim, ficava mal e era pouco jacobino.

A república em Portugal nasceu de um capricho com pouco afecto. No máximo, foi, em 1910, uma conclusão intelectual de uns quantos, que quando a não confundem com o regime democrático (meu Deus...), encontram nela o fim da história.

Agora é folcloricamente defendida pelo BE, cujas figuras de destaque se entretêm a dizer que não, que a I República como regime de guerra, de fome, de pancadaria policial, de anarquia pública, é impressão nossa e que é injusto ver esses anos doces 1910-1926 como a fonte, a causa, a origem de 40 anos da ditadura (republicana) que nos consumiu...

Uma espécie de pânico surdo e disfarçado atingiu determinados círculos. Uma bandeira azul e branca no Município de Lisboa. Imaginem só. Até as associações de ideias são um pesadelo.

O povo (esse que foge das comemorações do 5 de Outubro a sete pés) que não veja a mudança de bandeira. Sabe-se lá as ideias que poderia ter...

domingo, 9 de agosto de 2009

Verão

Bom tempo, tempo para sentir o vento, cheiro a mar, um País dourado.

Mais família, mais cor, mais calor.

Menos televisão, menos dos nossos políticos na televisão, ou nos jornais, menos do nosso Estado nas nossas vidas.

Que a nossa vida no verão é outra, com muito mais vida, em que as pessoas são mais livres.

Mais livres de se prenderem ao que mais interessa, aos que mais interessa.

E não é por não se trabalhar, porque só não se trabalha em parte do verão.

É porque no verão as coisas são mais equilibradas, há mais perspectiva e tem de haver tempo para tudo.

E há. O verão enche-se sempre de tempo.