sexta-feira, 16 de outubro de 2009

A Europa suicida

Não se pode imaginar o sofrimento dos 25 trabalhadores da France Telecom que se suicidaram nos últimos tempos, depois de meses e anos de implementação de medidas internas de flexibilidade geográfica e funcional e profunda reestruturação.

É das notícias mais tristes e preocupantes de que me lembro.

Mas são aflitivas as suas origens.

A Europa tratou, a partir de meados dos anos 60, de construir um "sonho europeu", ou mais rigorosamente, uma "ilusão europeia": trabalhar menos, ganhar mais, ter menos filhos, ter mais conforto, ter mais saúde, ter mais protecção social, educação até mais tarde, antecipar progressivamente a idade de acesso à reforma, não prejudicar o ambiente.

Este "projecto", situado a meio caminho entre a quadratura do círculo e a pedra filosofal, foi "vendido" às pessoas durante anos, tentando (com manifesto êxito) ocultar a sua própria mentira e impossibilidade.

A França, infelizmente, foi sempre líder dessa ilusão europeia e é justamente aí que se sente de modo mais dramático a forma crua e execrável como as pessoas foram confrontadas com a realidade.

O sonho desperto vale a pena, mas tem de fazer sentido, para não ser apenas desvario.

Pura e simplesmente, há ao menos dois pilares da "ilusão europeia" que têm de sucumbir, sob pena de a bomba demográfica matar qualquer hipótese de sonho verdadeiro, destruindo pelo caminho o Estado social: ou deixa de se tentar trabalhar menos e menos, ou se faz alguma coisa pela Natalidade.

Se assim não for, esta Europa que deixou de trabalhar e praticar desporto, que passa os dias em frente à televisão, que se tornou num continente em que o músculo deu lugar à gordura, o desencanto será cada vez maior por se dar de caras com o evidente: ter cada vez menos gente a trabalhar cada vez menos para sustentar a reforma cada vez mais antecipada de cada vez mais gente não é possível. Ponto.

E perdoem-me o conservadorismo à moda do Leopardo e Visconti - é preciso mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma, in casu, para salvar o núcleo essencial (mas só o essencial) do Estado social.

Como primeira escapatória, que jeito daria uma reconciliação da França com a sua história, com os valores cristãos, com os valores da família, com a convicção de que a democracia não deve cair na rua a cada instante, de que de Luís XVI para Robespierre se passou apenas do mau ao mau e que a Europa precisa de uma França que a consiga iluminar (do que é capaz), mas de que tanto o ancien régime, como o jacobinismo primário apenas trazem lhe escuridão.

Por isso a França tem perdido tanto e tanto para o Reino Unido, ou a Alemanha.

Por isso também a França tem de ficar à espera que os "malditos" EUA a salvem da crise, como antes a salvavam dos ataques e invasões da Alemanha...

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