domingo, 21 de junho de 2009

Isto para não falar...

Dizia há dias um jornalista, ao comparar, um a um, os actuais ministros do Governo com os seus antecessores, que um ex-ministro havia que era seu irmão, que por isso não se podia pronunciar, mas que esse ex-ministro, seu irmão era também melhor que quem lhe sucedeu no cargo.

Antes do mais, estamos perante o "isto para não falar..." seguido de 30 a 45 minutos de conversa acerca do tal "isto", modelo comunicacional próximo do "eu seria incapaz de dizer que o Senhor Dr. fez isto e aquilo e mais aquilo no dia tantos de tal pelas tantas horas, sem estar nesse momento a trabalhar e à vista de toda a gente".

É assim uma forma bizarra de incluir um off the record dentro de um on the record...

Mas enfim, não há dúvida que o direito ao estilo decorre de vários direitos constitucionalmente consagrados.

O pior é esta dificuldade de alguns meios nacionais de perceber que há coisas que "parecem mal". Um jornalista que comenta política a elogiar um irmão político "parece mal".

Poderia dizer-se que parece, mas não é. Mas as coisas não me parecem, nem são assim tão simples.

Eu sei que está na moda entender-se que um político (ou um jornalista) não tem de mudar nada quando se torna uma figura pública, o que regra geral se faz confundindo vida privada com vida íntima, de modo a que tudo o que faz fora das paredes do seu local de trabalho ser imediatamente reservado em termos fundamentalistas.

Mas não pode ser. Um político não tem o direito à reserva se ao fim-de-semana é visto a passear de carro e a deitar pela janela do carro um pacote leite vazio; ou se sai do seu gabinete e a primeira coisa que faz quando chega à rua é cuspir para o chão.

Do mesmo modo, as ligações familiares não são irrelevantes, porque geram uma situação de manifesto "conflito de interesses", ao menos em estado potencial: entre o interesse da informação e o interesse afectivo.

Argumente-se que um conflito potencial pode, ou não consumar-se. Mas justamente o que se passa quando há uma situação de conflito de interesses é que o agente não deve actuar em conflito potencial.

Com certeza que, por exemplo, há muitos e muitos juízes capazes de julgar bem um irmão e de manterem a sua imparcialidade. Mas entende-se - e bem - que sendo colocados nessa situação pelo acaso, dela devem sair. O simples risco torna a situação insuportável.

Por fim há ainda o aspecto estético da coisa, mas esse nem precisa de grandes comentários, ou precisa?

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